Dos conselheiros dos Tribunais de Contas, 20% respondem a inquéritos e processos
Eles estão ali para fiscalizar os gastos do setor público. Muitos, porém, não entenderam os limites e as responsabilidades do cargo que ocupam. Levantamento da Associação Nacional do Ministério Público de Contas mostra que 48 dos 240 ministros e conselheiros dos tribunais de contas brasileiros, sejam os estaduais ou o da União, sofreram ou enfrentam no momento algum tipo de investigação. Do envolvimento em fraudes clássicas, como licitações viciadas e superfaturamento, a casos insólitos, como o uso do cargo para pressionar prefeitos e vereadores a apoiar a candidatura do filho a deputado estadual, a lista de investigados nos últimos oito anos corresponde a 20% do total dos conselheiros do país.
Ao todo, são 55 inquéritos e processos. Jaleco, Taturana, Caixa de Pandora, Pasárgada e Navalha são algumas das operações policiais que tiveram, entre os alvos investigados, conselheiros de contas. Em Rondônia, por exemplo, seis dos sete conselheiros são investigados. Se o mesmo percentual de conselheiros suspeitos fosse aplicado no Judiciário, o número representaria nada menos do que 3.400 dos 17 mil magistrados brasileiros – mas não há oficialmente um percentual disponível sobre a quantidade de juízes sob algum tipo de investigação.
Enquanto o Congresso Nacional discute um instrumento de controle externo para os conselhos, proposto pelo Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 28/2007, a presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcom), Evelyn Pareja, prefere atacar a origem do problema. Para ela, é preciso aprovar uma lei que reserve uma fatia da composição dos tribunais, formados por sete conselheiros, a alguém de notório saber jurídico, em vez das tradicionais e imprevisíveis indicações políticas.
Entidade defende indicação técnica
Das sete vagas disponíveis, três são indicadas pelo governador e quatro pela Assembleia Legislativa, que frequentemente indica ex-deputados. Evelyn explicou que, por lei, o único pré-requisito exigido para a nomeação é a conduta ilibada. Porém, pelo volume de casos policiais envolvendo conselheiros, o filtro não impede a contaminação.
- O fato de ter sido deputado não habilita alguém para o tribunal. Para melhorar a composição, a alternativa é ampliar a participação das carreiras públicas – sustenta a presidente da Ampcom.
Hoje, ao prevalecer sobre o critério técnico, a nomeação política não apenas engorda os prontuários da Polícia como constrange o poder fiscalizador dos tribunais. Um dos casos levantados revela que, em Rondônia, um secretário estadual articulou um acordo para indenizar a própria empresa em R$ 4,5 milhões por desapropriação de terras em Porto Velho. Logo depois, nomeado conselheiro, aprovou as contas deste governo.
O exame dos casos investigados oferece um painel sobre o grau de contaminação dos tribunais. No Paraná, por exemplo, o dono de uma rádio nomeado conselheiro disse que não via problemas em conciliar as atividades, embora a emissora tivesse entre os anunciantes algumas prefeituras do estado, que ele próprio deveria fiscalizar.
Em Alagoas, um conselheiro foi acusado de ser dono de empresa que fabricava cadernos escolares e conciliar a atividade empresarial com a atuação como conselheiro, julgando as contas de prefeitos que compravam seus cadernos.
O conflito de interesses vai do Norte ao Sul do Brasil. Em Porto Alegre, um conselheiro empregou o filho no gabinete de um desembargador. Em troca, abrigava em seu próprio gabinete a filha do mesmo magistrado. Também no Rio Grande do Sul, um conselheiro usou laranjas para manter as atividades de uma empresa que mantinha contratos com a área pública.
Alguns casos chegam a ser folclóricos. Na Bahia, a Promotoria de Justiça de Combate à Improbidade Administrativa investigou suposta relação conflituosa entre as funções de conselheiro do Tribunal de Contas do Município e presidente “fantasma” de um clube de futebol. No Ceará, um conselheiro fez questão de participar de convenção partidária em seu reduto eleitoral.
Outros casos, porém, não são tão prosaicos assim. Na lista de conselheiros investigados, aparecem suspeitos de tráfico de drogas, crimes contra o meio ambiente, pedofilia e até homicídios.
Mas a maioria das situação é a clássica combinação entre corrupção, fraude administrativa e formação de quadrilha. A clientela que vai ao balcão dos conselhos também não surpreende: empreiteiras, prestadores de serviços, concessionárias e fornecedores em geral, além de uma lista de autoridades públicas dispostas a evitar a todo custo a rejeição de suas contas.
Inspirada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a PEC 28/2007 propõe a criação do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas, integrado por membros dos tribunais de contas, além de representantes do Ministério Público e auditores com assento nestes órgãos.
Embora não se oponha ao conselho, a presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas, Evelyn Pareja, está como o pé atrás, uma vez que a PEC amplia esse poder fiscalizador do futuro órgão para os membros do Ministério Público que atuam nos tribunais.
Para ela, a medida vai enfraquecer o MPC e piorar essa situação, “pois os procuradores do MPC hoje são uma das poucas pedras no sapato que os tribunais têm”.
Evelyn explica que, pelo papel que exercem, esses procuradores têm condições de reduzir a quantidade de casos que mancham os tribunais de contas do país.
- Com a nossa independência funcional, atuamos como fiscais dos atos dos conselheiros. Mas, se a PEC for aprovada, isso vai acabar. Seremos submetidos ao controle de quem devemos investigar – lamenta a dirigente de classe.
A associação não quer ficar livre do controle externo, mas defende um conselho próprio para a classe. ■
Fonte: http://jogodopoder.wordpress.com/2011/05/23/fiscalizacao-sob-suspeita-de-fiscais-a-investigados-20-dos-conselheiros-dos-tribunais-de-contas-respondem-a-inqueritos-e-processos/
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