EMBARGOS INFRINGENTES
O juridiquês é uma expressão pejorativa que se refere aos termos da
técnica jurídica empregada nos processos judiciais que por sua
complexidade e em razão da natureza dos institutos jurídicos terminam
por criar embaraços à compreensão do processo pelo cidadão comum. Toda e
qualquer ciência tem seus princípios, regramentos e técnica própria que
criam dificuldades para quem não seja especialista e o direito não foge
a regra. O mesmo se diz em relação à ciência econômica onde tem lugar o
economês.
Existe uma tentativa, de boca para fora, de simplificar
as expressões jurídicas para tornar os textos técnicos mais acessíveis
aos cidadãos. O próprio STF tem esse discurso, conquanto a leitura e
interpretação das discussões ali travadas não se conformam ao operador
do direito de mediano para baixo conhecimento, tamanhas as expressões,
termos técnicos, princípios e expressões linguísticas empregadas.
Acessando o Boletim do STF, em julgamento de HC se empregou: “pas de
nullités sans grief”, quando bastaria se dizer: “a declaração de
nulidade requer a efetiva comprovação de prejuízo à parte”.
Nas duas
últimas semanas e até a próxima 4ª feira, toda a mídia nacional
(falada, escrita, televisada, grandes jornais, redes de televisão e a
barricada heroica dos blogs) estará voltada para o julgamento dos
chamados Embargos Infringentes que poderão proporcionar a revisão do
julgamento e das penas aplicadas a alguns dos réus da AP 470 e isso vem
deixando exasperados os representantes do pensamento conservador
brasileiro que não demonstram despudor quando as garantias
constitucionais e processuais são desprezadas para atendimento de seus
sentimentos pessoais.
Nas sessões dos dias 12 e 13 últimos o STF
se debruçou sobre o cabimento ou não do recurso interno denominado
Embargos Infringentes, cominando com a divisão da Corte sobre a matéria e
que terá no Ministro Celso de Mello, o decano da Corte, o voto de
minerva, embora essa expressão seja reservada a voto de desempate por
Presidente de entidade, para dizer se são cabíveis ou não os Embargos
Infringentes nas ações penais da competência originária. Já se antevê
para desgosto de J.B, Gilmar e Marco Aurélio que despojaram da beca
judicante para se colocarem como advogados de acusação contra os réus da
ação penal, na sessão da última 5ª feira.
Falou-se em embargos de
declaração e embargos infringentes e isso deixa a todos intrigados e a
indagar porque se os réus que já foram condenados porque tanto puxe e
encolhe e não vão logo para a cadeia como pretendia o ex-Procurador da
República, independentemente do trânsito em julgado. Quando usei a
expressão juridiquês, é para dizer que o cidadão deve se preocupar mais
com o desfecho da AP 470 que poderá lhes causar danos irreparáveis do
que os termos de técnica jurídica empregados.
Tem-se ouvido nas
sessões do STF, falar em embargos de declaração, embargos infringentes,
ações penais da competência originária, revisão criminal, foro
privilegiado, perda de mandato parlamentar, efeitos da sentença, coisa
julgada, amplo direito de defesa, revogação, derrogação, recepção de
norma pela constituição de 1988 e por ai afora.
A ação penal 470
foi proposta e julgada pelo STF e seu processamento rompeu paradigmas,
subverteu valores e contrariou conquistas históricas e até inalienáveis,
tudo bem definido não para punir possíveis corruptos e estancar a orgia
com o dinheiro, posto que a Corte jamais deixasse de se comportar como
departamento próprio de embargos de gaveta nas demandas de interesse do
PSDB e do DEM, mais para macular uma Era da história do Brasil.
Para
quem é contra a Era Lula-Dilma (os originariamente nascidos da UDN e
ARENA e que passaram ou não pelo PFL e agora DEM-PSDB) dirá que Zé
Dirceu e Genuíno reúnem tudo de podre da República e deverão ir logo
para a cadeia e quem é petista ou partidário da liderança Lula dirá que o
chamado mensalão foi uma criação da mídia e dos conservadores para
desestabilizar o Governo Lula a criar um novo Collor de Melo. Não tenho
dúvida alguma de que a direita saudosista com seus interesses
contrariados não somente tentaram desestabilizar o Governo Lula a forçar
uma renúncia ou impeachment do então Presidente, como por intermédio da
imprensa forçaram o também ultraconservador STF a recorrer a uma
“teoria do domínio do fato” de difícil compreensão e utilidade prática
para receber e processar a AP 470.
De uma forma ou de outra, no
futuro, quando se estiver estudando a história do Brasil das últimas
duas décadas se dirá que o País se desenvolveu, criou empregos, aumentou
as exportações, proporcionou ascensão socioeconômico das camadas menos
privilegiadas da população, combateu as desigualdades sociais e
regionais e que o Brasil passou a ser o 6º País mais rico do mundo e se
colocou como Nação influente no plano internacional, porém, no mesmo
período, se dirá que o período foi marcado pela corrupção, no melhor
estilo Carlos Lacerda na campanha contra Getúlio Vargas, maculando a Era
Lula.
O que deverá ser perguntado é o que a AP 470 interessará ao
cidadão comum caso o Ministro Celso de Mello venha contrariar sua
posição amplamente difundida e votar pelo descabimento dos embargos
infringentes de modo geral ou pelo descabimento deles nas ações penais
originárias como é o seu posicionamento. O noticiário de imprensa de
hoje, 15.09, anuncia que o voto do Ministro Celso de Melo será como o
Sermão da Montanha, tamanha profundidade e estrutura ética, com
possíveis recados diretos aos Ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio.
Uma
breve lembrança. O Ministro Gilmar Mendes é aquele que por decisão
proferida na madrugada, em HC, concedeu liminar pondo em liberdade
Daniel Dantas, o megainvestidor metido em falcatruas financeiras. O Min.
Marco Aurélio é primo do ex-presidente Collor de Melo e foi por este
indicado para o STF. É o mesmo Ministro que concedeu liminar em habeas
Corpus em favor de Salvatore Alberto Cacciola, banqueiro
ítalo-brasileiro proprietário do Banco Marka e metido em crimes
financeiros de toda ordem que foi condenado à prisão. Depois da liminar
deferida pelo Min. Marco Aurélio o banqueiro fugiu no Brasil e foi se
refugiar na Europa onde passou 06 anos, até ser extraditado para o
Brasil e cumprir pena no Complexo Bangu 8, no Rio. Na última sessão do
STF eles foram os que se disseram mais indignados se acolhidos os
embargos infringentes.
Como estamos em Paulo Afonso, vejamos o que ocorre.
Se
alguém comete um crime e é julgado e condenado aqui na Comarca, ele
poderá recorrer ao Tribunal de Justiça da Bahia e, posteriormente, ao
STJ e/ou ao STF, tendo ele a garantia de que sua condenação poderá ser
revista com sua absolvição ou alteração das penas impostas ou a
manutenção delas. É o princípio do duplo grau de jurisdição que tem
residência no art. 5º, LV, da CF.
Em alguns casos, porém, a pessoa é
processada pelo próprio STF que atua como única instância. Isso acontece
quando a pessoa processada tem foro privilegiado pela prerrogativa da
função. É o caso do Presidente da República, Deputados, Ministros e mais
outros praticarem crimes comuns. Na hipótese, condenados os réus como
foram na AP 470, não há outra instância superior a recorrer por ser o
STF à única.
O julgamento da AP 470 foi programado ex-ministro Ayres
de Brito para terminar antes das eleições municipais de 2012 e
repercutir negativamente no desempenho do PT, especialmente, nas
eleições municipais de São Paulo e mesmo assim o PT venceu na Capital
Paulista. O processo reuniu milhares de páginas e era inevitável que
pela pressa e a vontade manifesta dos ministros ultraconservadores da
Corte, leia-se Barbosa, Gilmar Mendes, Marco Aurélio de Mello, Peluzo,
Aires de Brito e, circunstancialmente, a diana do pastoril, Luís Fux, de
resultar equívocos na avaliação das provas e na dosimetria das penas
aplicadas, como efetivamente isso aconteceu. Felizmente Aires de Brito e
Peluzo já se aposentaram e isso proporcionou o ingresso de dois
Ministros a contrabalançar o conservadorismo exacerbado.
Como alguns
dos acusados foram condenados por maioria de votos em única instancia,
lhes é reservado o direito de opor Embargos Infringentes a possibilitar
um novo julgamento ou diminuição nas penas impostas, cujo recurso
interno é previsto no Regimento Interno do STF, como também é instituto
de direito processual penal tratado no art. 609 e seu parágrafo único do
Código de Processo Penal. O diferencial, é que os Embargos Infringentes
do CPP são previstos incidentalmente em julgamento de recurso de
apelação penal nos tribunais inferiores, não expressando o mesmo diploma
em relação aos julgamentos no STF e no STJ.
Os Embargos
Infringentes do regimento interno do STF não foram somente recepcionados
pela Carta Federal de 1988, como também não poderiam ser desprezados
nos julgamento de ações penais da competência originária das Cortes
Superiores, o que acontecendo, teríamos tratamentos desiguais para
iguais situações. Como o julgamento da AP 470 se deu em única instância,
é da boa política criminal a revisão do julgado pela mesma da Corte,
em sede de Embargos Infringentes, antes da execução da pena, quando a
condenação criminal foi por voto de maioria, na previsão do art. 609,
parágrafo único, do CPC, e art. 333, I, do RISTF que prevê: “Art. 333.
Cabem embargos infringentes à decisão não unânime deu Plenário ou da
Turma. I – Que julgar procedente a ação penal.
No meu entendimento, o
Ministro Celso de Melo que pela sua história de garantista, acolherá os
Embargos Infringentes dos réus na AP 470, mantendo a tradição e
reconhecendo a garantia constitucional-processual-penal dada ao cidadão,
por norma ordinária, especial ou interna de da Corte.
O INJUSTIÇADO
LUIZ GUSHIKEN. O ex-Procurador da República e subscritor da denúncia da
AP 470, Dr. Antônio Fernando de Souza, deve ter dormido a última noite
com seus pesadelos. Na denúncia da AP 470 ele incluiu como réu Luiz
Gushiken, militante fundador do PT, dirigente sindical, ex-deputado e
ex-ministro que foi enterrado no dia de ontem depois de uma árdua luta
contra um câncer. Denunciado Luiz Gushiken, seu nome e sua história
política e de vida ficaram maculados e a nódoa imposta a sua biografia o
jogou para a sarjeta da vida política e jamais será recuperada em sua
plenitude. No curso da ação penal, o próprio procurador denunciante
pediu a absolvição de Luiz Gushiken por falta de prova. Ora, se não
tinha prova contra o réu, porque o denunciou? Porque tamanha
irresponsabilidade funcional a desonrar família alheia?
Paulo Afonso, 15 de setembro de 2013.
Antonio Fernando Dantas Montalvão. montalvao@montalvao.adv.br
Escrit. Montalvão Advogados Associados.
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